sexta-feira, 27 de junho de 2014

Sobre o sentir e os suicidas.

Ah essa nossa incompletude
nos mata aos poucos,
muito mais eficaz que o passar do tempo.
A gente só é quando gêmeo em algo.
Quando acha o sentido e o fluxo.
Para uns é a vontade de alcançar o outro.
de chegar lá…
é a mão dada
Essa nossa eterna inocência em ser resposta, só por não poder lidar com incapacidades
As tais mãos atadas doem como a cruz.
As vezes não podemos.
As vezes não tocamos,
as vezes nosso amor não tange o do outro,
não se tocam esses círculos,
 as vezes não se cruzam,
não viram esse infinito.
Li alguém falar a um suicida,
um estender a mão depois do fim,
A tentativa pretérita falida
Como se fosse possível atrasar aquele tempo.
Como se fosse dor.
Sentir é viver, não se morre na dor.
A gente morre é no vazio
As vezes tão grande que o outro não preenche.
Não alcança
Paralela
Indagou-se a agonia: “e se espalhássemos amor?”
Respondeu a verdade: “por você ou para o outro? Dê a sua compreensão, dê espaço. Saque a razão do bolso, e guarde-a junto ao peito que as respostas valem nada no depois”.
Espalho amor?
Espalho, jogo na cara do mundo para não morrer de inanição,
de palavra presa,
de amor acumulado, ou sufocado sem se dar.
Transbordo sim
transbordo para ser.
Quando se deixa ser vazio, o alívio de não ser nada, é maior que a compaixão.
Suprime lógica, invalida a razão.
Quem não tem amor pra si não se toca com amor do outro…

5 comentários:

  1. Ei flor! Delícia te inspirar, mesmo que com temas mais tristes, tensos. Prova de que a gente se conecta, de que não há o vazio/vácuo que não deixa o som reverberar.

    " as vezes nosso amor não tange o do outro,
    não se tocam esses círculos,"

    Não tinha mesmo pensado sobre este ponto, de que enviar algo nunca é certeza de que este algo irá chegar. Mas não transbordar também é ser um pouco vazio, por isso continuo firme com a certeza de que é preciso tentar. Nossos sentimentos sempre serão nossos e é nossa responsabilidade o que fazemos com eles. Assim, se deixamos de dizê-los, de mostrá-los, a possibilidade de conexão vira impossibilidade. Mas se eles saem despretensiosamente de nós, com apenas a esperança de chegar, ainda que não toquem diretamente a pessoa em questão já terão se materializado de alguma maneira. Enfim, é preciso tentar, apesar das dúvidas.

    "Quem não tem amor pra si não se toca com amor do outro…" Fato! Mas às vezes temos amor pra nós e mesmo assim não nos tocamos... Às vezes é amor demais por si próprio, ou egoísmo demais o que não permite ser tocado. Há ainda outras hipóteses, como estar nublado pela tristeza ou por algum outro sentimento ruim e não conseguir mesmo enxergar, perceber, sentir o amor do outro... Complicado de entender...

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    1. Amar pra mim é verbo intransitivo. A gente se esvazia muitas vezes quando joga o amor no mundo como coisa objetiva, como a flecha a existir em função de um alvo. Essa viagem é infinita, sem volta, e como se fosse um novelo de lã a soltar a ponta, leva de dentro da gente o amor. Não tenho nenhuma pretensão de cravar nada, de ser porta voz de coisa alguma. Só que nessas vezes me esvaziei. Corri atrás desse meu amor atirado, e não achei mais nada. Deixou de pertencer-me. Amor que encontrei pelo meu caminho foi o que dei apenas. Dei ao mundo, como uma chuva fina, que está sempre por ai, pra me encontrar de novo. Para molhar alguém, perene...

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    2. Achei perfeita a sua observação sobre egoísmo. Concordo demais.
      PS. Obrigada pelas palavras, sempre...

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  2. A questão do suicida não está bem no mundo de fora, mas no fato de ele mesmo, ser um vazio em si. O sentimento de vazio é algo inexplicável pra maioria, mas quem sente sabe. A incapacidade de sentir a si mesmo, cria um vácuo que suga o resto do mundo todo. Não se sente nada, é como estar num buraco, sozinho, com todas as comunicações cortadas. não se enxerga nada. Nada pode tocar um corpo vazio. Assim, sem sentir a si, ele não pode dar, nem receber. O suicida deixa de existir, ainda que esteja presente. Mas sim, as palavras, pequenas luzes, podem tirar a pessoa do buraco, mostrar que ela tem valor, que ela ama e pode amar. Dar a mão, tirar do buraco, acender a luz. Um toque, pode fazer toda diferença.

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    1. As pessoas menosprezam mesmo a função da palavra. A necessidade do homem de se fazer entender, de comunicar, de tocar o outro para mim, que resultou na criação dos códigos para que o homem chegasse ao outro. Acho mesmo que a palavra tem mais eficiência contra o vazio que propriamente só o amor. Principalmente no silêncio. "O silêncio é a gente mesmo, demais" escreveu Guimarães Rosa. Pode parecer paradoxal, mas contra o vazio, a arma mais potente que o outro pode nos ofertar é ouvir.

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